A 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça alterou seu entendimento, pacificando a jurisprudência da Corte e se alinhando aos julgados da 3ª Turma, excluindo a possibilidade de responsabilização das seguradoras pelo dever de informação aos segurados quanto as cláusulas dos contratos de seguro coletivos.
O voto proferido pela Ministra Maria Isabel Gallotti, nos autos do Recurso Especial nº 1.850.961-SC, com julgamento concluído em 15 de junho de 2021 e acórdão publicado em 31 de agosto do mesmo ano, prevaleceu, propondo um reexame do tema a partir justamente das características próprias dos contratos de seguro em grupo, descritos a partir das normas regulamentares do Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP).
O caso concreto, consigna-se, diz respeito a segurado que, após acionar a seguradora, surpreendeu-se ao tomar conhecimento de apólice do contrato em que havia previsão expressa excluindo a cobertura de invalidez parcial decorrente de doença profissional.
Tal entendimento adotado pela Colenda Corte Superior corrobora o disposto na legislação, que já vinha aclarando as distinções relativas aos contratos de seguro em grupo.
Exemplo disso é a Resolução 107/2004 do CNSP, ao prever que o “Estipulante é a pessoa física ou jurídica que contrata apólice coletiva de seguros, ficando investido dos poderes de representação dos segurados perante as sociedades seguradoras, nos termos dessa resolução.”. Tal disposição vai justamente ao encontro do art. 801, §1º, do Código Civil, que define não ser o estipulante o representante do segurador perante o grupo segurado.
Também serviu como fundamento para a decisão o Decreto-Lei nº 73/66, que, em seu art. 21, §2º, equipara o estipulante ao segurado nos contratos de seguro, sendo seu mandatário legal.
Nesses termos, o estipulante possui mandato legalmente constituído para, em nome dos segurados, negociar e pactuar as condições do referido contrato, assumindo responsabilidade na publicização de seus termos aos integrantes do grupo, que poderão ser eventualmente beneficiários do seguro.
Trata-se, portanto, de reconhecer o papel central do estipulante, que é a figura responsável pela contratação do seguro, bem como sua negociação face ao grupo de segurados e a consequente adesão desse grupo aos termos e coberturas do seguro. A representação do estipulante na contratação advém de um vínculo preexistente, seja ele trabalhista ou associativo, obtendo poderes para, em representação aos eventuais segurados, estabelecer as bases do contrato.
Definiu-se, assim, que no instante em que o segurado optar por aderir ao seguro proposto, as bases contratuais que estabelecem e especificam a abrangência da cobertura, seus prêmios e condições, já foram definidas a partir das negociações entre seguradora e estipulante, permitindo ao grupo se beneficiar das benesses da contratação em bloco.
Esse é o alicerce do voto da Excelentíssima Ministra Maria Isabel Gallotti, afirmando, inclusive, que “antes das adesões das pessoas vinculadas ao estipulante, a entidade seguradora sequer pode identificar com precisão os indivíduos que efetivamente irão compor o grupo segurado e nem aqueles que, ao longo da relação contratual, aderiram ou se desvincularam desse grupo, o que evidencia não ser compatível com a estrutura do contrato coletivo atribuir à seguradora o dever de prestar informações diretamente ao segurado.”
Portanto, sendo a negociação dos termos do contrato principal anterior a sua celebração, a Corte entendeu que o dever de informação, necessariamente prévio a celebração do contrato, cabe ao estipulante, desincumbindo-se as seguradoras do dever de informar individualmente aos segurados acerca de efetiva cobertura securitária e suas exceções. Nesse caso, cabe a seguradora tão somente fornecer todos os elementos acerca das garantias oferecidas ao estipulante e dele receber as informações sobre o grupo que será posteriormente segurado e a ele vinculado.
Divergiram do entendimento da i. Ministra Relatora os Ministros Raul Araújo e Marco Buzzi, para os quais o dever de informação também pode ser imputado a seguradora, tendo em vista que a existência da figura do estipulante não afastaria o dever e obrigação de informação, enquanto fornecedora, nos termos do Código de Defesa do Consumidor. Contudo, tal posicionamento não prevaleceu, restando, assim, superado.
Diante da pacificação do entendimento, o tema não mais precisará ser revisitado na Corte Superior, possuindo a referida sessão função de dirimir o desacordo anteriormente existente entre as turmas que julgam termas relativos a Direito Privado.
Formaram maioria com a relatora os Ministros Luís Felipe Salomão e Antonio Carlos Ferreira.
Assim, enfrentado o tema, cabe atenção especial por parte tanto das entidades estipuladas, quanto das seguradoras e, especialmente dos segurados, a fim de que se busque garantir o acesso pleno a informação ao grupo segurado, evitando-se interpretações desvirtuadas sobre a efetiva cobertura securitária nos contratos de seguro em grupo.
Matteus Henrique de Oliveira
Advogado. Mestrando em Direito pela Universidade de Brasília (UnB). Pós-graduando em Direito e Processo Tributário pela Academia Brasileira de Direito Constitucional (ABDConst). Pós-graduando em Direito Civil pela Fundação Escola Superior do Ministério Público. Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Paraná (UFPR).
Art. 801. O seguro de pessoas pode ser estipulado por pessoa natural ou jurídica em proveito de grupo que a ela, de qualquer modo, se vincule.
Art 21. Nos casos de seguros legalmente obrigatórios, o estipulante equipara-se ao segurado para os eleitos de contratação e manutenção do seguro.
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