Historicamente, a aquisição de imóveis se mostrou investimento sólido e seguro. Afinal de contas, nenhuma outra modalidade de investimento é tão bem conhecida e regulamentada quanto a imobiliária, tampouco segura a ponto de ser uma unanimidade na sociedade.
É bem verdade, por outro lado, que a maioria das pessoas não transaciona no mercado imobiliário habitualmente, isto é, com o preponderante objetivo de investir em diversos imóveis e deles obter retorno financeiro, circunstância que pode levá-las a crer, quando deparadas com uma situação de aquisição, que o mero formalismo contratual já é suficiente para tornar a compra juridicamente segura.
Tal senso comum de que a aquisição de propriedade imobiliária urbana é naturalmente segura e avessa à riscos, comumente leva os adquirentes de imóveis a negligenciarem a etapa primordial do levantamento de dados e informações sobre o bem e seu alienante, também nominada como due dilligence, imprescindível para a consecução de uma boa e segura compra.
Nesse sentido, é de extrema importância destacar que os adquirentes de imóveis devem estar atentos no sentido de que a segurança perseguida advém da propriedade regular do bem e não propriamente de seu processo formal de aquisição. Apesar de distintas, as observações são confundidas e levam muitos a celebrar negócios deficientes e perigosos, sob o ponto de vista da transação imobiliária.
Não se deve imaginar, contudo, que a aquisição de um imóvel importa num processo eivado de insegurança, isso porque, cumpridas algumas etapas e promovidas cuidadosas pesquisas destinadas a exaurir o exame documental, o adquirente poderá estar tranquiilo quanto à compra que deseja promover, ao alcançar suficiente embasamento jurídico para prosseguir com seu investimento.
Dentre as etapas que devem ser cumpridas anteriormente à celebração do negócio, destacam-se, com maior relevância, a obtenção da matrícula imobiliária, certidões vintenárias, certidões negativas fiscais e de ações, p.ex., além da detida análise dos documentos pessoais e da vida pretérita/particular/empresarial dos alienantes dos imóveis e, em alguns casos, dos que lhes antecederam.
Ao se iniciar pelo estudo minucioso da matrícula imobiliária – pela qual os adquirentes poderão ter acesso aos detalhes documentais dos bens, bem como ao seu histórico e transações pretéritas – é certo que os interessados começarão sua busca com bom norte e embasamento acerca das principais características do imóvel.
Compulsando tais documentos (cujo caráter público facilita suas obtenções junto aos Ofícios Registrais competentes), os pretensos compradores poderão tomar ciência das eventuais existências de hipotecas, alienações fiduciárias e penhoras, com o fito de aquilatar se o imóvel garante ou garantiu dívidas judiciais ou extrajudiciais, servindo de indicativo até mesmo para um aprofundamento na investigação acerca da saúde financeira dos alienantes. Ademais, a análise da matrícula também demonstrará a existência de compromissos de compra e venda, escrituras e outros tipos de transação levadas a efeito, que podem se mostrar reveladores de outros problemas possivelmente ocultos.
É importante que se mencione, a propósito do caráter público da matrícula, que os atos nela registrados são presumidamente conhecidos por terceiros. Ou seja, é obrigação tácita dos adquirentes, ao examinarem a situação do imóvel, conhecer o seu teor, de modo que não poderão alegar desconhecimento futuramente, especialmente nas hipóteses em que são expressamente dispensadas, nas escrituras públicas, a apresentação de algumas certidões negativas ou circunstanciadas.
Medida diversa, mas não menos importante, é a obtenção de certidões negativas fiscais, judiciais e extrajudiciais dos vendedores. De posse de tais documentos, os adquirentes poderão verificar se existem dívidas tributárias exigidas ou exigíveis dos vendedores e/ou protestos e ações judiciais movidas em seus desfavores. Releva mencionar que acaso positivas, as certidões imprimirão maior cautela à situação, mas por si só passam longe de representar óbice imediato ao negócio de compra e venda, especialmente nas hipóteses em que eventuais dívidas estejam garantidas por outros bens.
Tal cautela se deve ao fato de, no Direito Brasileiro, estar em vigência o chamado Princípio da Patrimonialidade, pelo qual os bens do devedor serão a garantia de suas dívidas. Assim, acaso existente dívida em nome dos vendedores dos imóveis, seus patrimônios podem estar sujeitos a risco, fator que torna a aquisição mais complexa e demanda especiais cuidados.
Ainda no rol de certidões e declarações, uma pesquisa junto ao Município tornará conhecida a existência de tributos e multas, atinentes ao imóvel, pendentes de pagamento por parte dos vendedores. Importa ressaltar, aqui, que os débitos imobiliários são dotados de caráter propter rem, significando que perseguem o imóvel e não os proprietários da oportunidade em que foram contraídos.
Ademais, adquirido o imóvel, prevalece a presunção de que eventuais dívidas a eles estarão vinculadas, ou seja, frente a característica propter rem, se torna prudente, acaso o imóvel integre um condomínio (edilício, comercial ou residencial), que se pesquise a existência de débitos de taxas condominiais – as quais também acompanharão o imóvel.
Já no âmbito da esfera privada dos vendedores, uma pesquisa cartorial a respeito da existência de casamento e seu respectivo regime de bens, será útil a averiguar eventual participação de terceiros nos direitos inerentes aos imóveis e a conseguinte necessidade de obtenção de outorga uxória do cônjuge ou companheiro – ato de concordância expressa com a alienação –, sob pena de invalidez do negócio.
Por último, no caso de vendedora pessoa jurídica, precauções adicionais devem ser tomadas para que se evitem transtornos. Isso porque, a habitual existência de dívidas em empresas, em que pese não seja alarmante em princípio, pode demonstrar eventual má-fé do empresário em se desfazer dos imóveis de propriedade da sociedade, na hipótese de estar buscando dissipar patrimônio da empresa para inadimplir credores. Nesse particular aspecto, hoje são inúmeros os casos de desconsideração, inclusive inversa, das personalidades jurídicas.
Em sendo essa a hipótese, as vendas (conquanto de boa-fé pelo lado dos adquirentes), podem estar eivadas de fraude (por escolha do alienante), ensejando a sua anulação pela Justiça.
Ultrapassadas tais etapas, os adquirentes certamente estarão muito mais abalizados para prosseguir, ou não, com a compra do imóvel, podendo usufruir, em caso positivo e dali em diante, da tão falada solidez da propriedade imobiliária.
César Almeida Bertoldi – OAB/PR nº 90.452
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