Desapropriação

DESAPROPRIAÇÃO PARCIAL DE IMÓVEL E O DIREITO DE EXTENSÃO DO PROPRIETÁRIO

  • Por:Cunha de Almeida
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Por: João Otávio Simões Pinto Dalloso

 

A desapropriação representa uma das formas mais incisivas de intervenção Estatal sobre a propriedade privada. Nela, mediante o pagamento de justa e prévia indenização, o Estado pode declarar a utilidade e/ou necessidade pública, ou o interesse social de determinado bem, impondo ao particular a perda da sua titularidade.

 

Trata-se do princípio da preponderância do interesse público sobre o privado, corolário da atuação da administração pública, legitimando a consumação do ato expropriatório para que os interesses da coletividade prevaleçam sobre os individuais, no caso, o direito de propriedade.

 

O exercício desse poder-dever pelo ente público, por estar lastreado na discricionariedade do ato administrativo, permite a ele decidir, por si só, de qual forma a expropriação melhor atenderá o interesse público, resultando muitas vezes na desapropriação de parte do bem, preservando-se a área remanescente sob a titularidade do proprietário.

 

Nesses casos, a indenização a ser paga deverá corresponder ao valor da área ideal do imóvel revertida ao patrimônio público, mais as perdas e danos sofridas pelo proprietário em virtude daquele ato. Tais prejuízos podem se dar das mais variadas formas, a exemplo do dispêndio de recursos financeiros para adaptações estruturais e funcionais sobre a área não alcançada pela desapropriação, bem como a desvalorização da parte remanescente do imóvel, que sofrerá redução de seu potencial econômico.

 

Importante registrar que o dever do Estado indenizar com justiça o particular ao impor-lhe a perda de uma parte ou do todo de sua propriedade, decorre da própria Constituição Federal, que em seu artigo 5º, inciso XXIV, dispõe que “a lei estabelecerá o procedimento para desapropriação por necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro, ressalvados os casos previstos nesta Constituição.

 

Ou seja, a Carta Magna garante ao administrado expropriado uma justa indenização pela perda de sua propriedade, a qual não ficará restrita tão somente ao valor da área convertida ao Estado, mas também deverá recompensar todos os prejuízos decorrentes do ato exercido pela administração pública.

 

Celso Antônio Bandeira de Mello, renomado jurista e doutrinador na área do Direito Administrativo, tratou[1] o tema de forma muito esclarecedora ao mencionar que, “nos termos do art. 5º, XXIV, da Constituição, a indenização deve ser justa. Em consequência, há de deixar o expropriado com seu patrimônio indene, sem prejuízo, sem desfalque algum”.

 

A partir dessa previsão constitucional, também consagrada como o princípio da justa indenização, surgiu o Direito de Extensão, consistente na possibilidade concedida ao expropriado de, caso a área remanescente de seu imóvel perca a utilidade ou tenha esvaziado seu conteúdo econômico de forma considerável, requerer ao Poder Público que estenda a desapropriação para a integralidade do bem, adequando a indenização para equivalente ao todo patrimonial expropriado, garantindo-se, assim, a adequada reposição patrimonial do administrado.

 

Caso não haja acordo na via administrativa, poderá o proprietário pleitear o reconhecimento de seu direito judicialmente, inclusive utilizando-se de uma perícia judicial como meio para comprovar a situação.

 

A base legal do chamado Direito de Extensão tem origem no Decreto Federal nº 4.956 de 1.903, posteriormente revogado, sendo plenamente reconhecido pela doutrina e jurisprudência pátrias[2], tratando-se, portanto, de uma consolidada garantia de justa recompensa ao administrado, diante do sacrifício de seu direito de propriedade.

 

Nesse sentido, soa salutar colacionar julgado recente do E. TJPR que trata do tema com precisão, ao reconhecer o direito do desapropriado em receber a indenização complementar:

 

“APELAÇÕES CÍVEIS E REMESSA NECESSÁRIA. DESAPROPRIAÇÃO. (…) 2. DIREITO DE EXTENSÃO. ÁREA REMANESCENTE INSERVÍVEL AO PARTICULAR. INCORPORAÇÃO AO PATRIMÔNIO PÚBLICO. 3. VALOR DA INDENIZAÇÃO. LAUDO PERICIAL QUE APONTOU O VALOR DO METRO QUADRADO DE MANEIRA ESCORREITA. PROVA TÉCNICA ACOLHIDA. PERITO IMPARCIAL E EQUIDISTANTE DAS PARTES. (…)

O ‘direito de extensão’ é o instituto pelo qual se amplia o objeto da desapropriação, fazendo com que a parte inservível do imóvel seja revertida ao patrimônio público. (…) O direito de extensão independe de previsão no Decreto Expropriatório, tendo em vista que possui o intuito justamente de ampliar o objeto da desapropriação a fim de assegurar que a parte que restou inservível ao particular seja incorporada ao patrimônio público mediante o pagamento de justa indenização. (…)”

(TJPR – 4ª Câmara Cível – 0014155-64.2018.8.16.0031 – Guarapuava –  Rel.: DESEMBARGADOR LUIZ TARO OYAMA –  J. 04.04.2023)

 

Em resumo, se a desapropriação parcial de um imóvel implicar em considerável perda e/ou desvalorização da área remanescente, o proprietário poderá requerer que o ato expropriatório seja estendido à totalidade do bem, com indenização equivalente pelo Poder Público, preservando seu patrimônio na íntegra, mesmo diante da perda do domínio sobre o imóvel.

 

 

João Otávio Simões Pinto Dalloso

OAB-PR 45.004

[1] Curso de Direito Administrativo. Malheiros, 2017. 34ª edição.

 

[2] “O direito de extensão é o que assiste ao proprietário de exigir que na desapropriação se inclua a parte restante do bem expropriado, que se tornou inútil ou de difícil utilização. Tal direito está expressamente reconhecido no art. 12 do Dec. Federal 4.956/03”. (MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 33ª edição atualizada. São Paulo: Editora Malheiros, 2007)

 

“ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO. UTILIDADE PÚBLICA. DIREITO DE EXTENSÃO. CONTESTAÇÃO. POSSIBILIDADE. 1. Direito de extensão é o que assiste ao proprietário de exigir que se inclua no plano de desapropriação a parte remanescente do bem, que se tornou inútil ou de difícil utilização. 2. ‘(…) o pedido de extensão é formulado na via administrativa, quando há a perspectiva de acordo, ou na via judicial, neste caso por ocasião da contestação. O réu, impugnando o valor ofertado pelo expropriante, apresenta outra avaliação do bem, considerando a sua integralidade, e não a sua parcialidade, como pretendia o autor. O juiz, se reconhecer presentes os elementos do direito, fixará a indenização correspondente à integralidade do bem. Resulta daí que é o bem, da mesma forma em sua integralidade, que se transferirá ao patrimônio do expropriante’ (José dos Santos Carvalho Filho, Manual de Direito Administrativo, 11ª edição, Editora Lumen Juris, Rio de Janeiro, 2004, p. 723). 3. O direito de extensão nada mais é do que a impugnação do preço ofertado pelo expropriante. O réu, quando impugna na contestação o valor ofertado, apresenta outra avaliação do bem, abrangendo a integralidade do imóvel, e não apenas a parte incluída no plano de desapropriação. Assim, o pedido de extensão formulado na contestação em nada ofende o art. 20 do Decreto-Lei 3.365/41, segundo o qual a contestação somente pode versar sobre ‘vício do processo judicial ou impugnação do preço’. Precedentes de ambas as Turmas de Direito Público.” (STJ, Segunda Turma, REsp 986.386/SP, Rel. Ministro Castro Meira, DJe de 17/03/2008)

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