Por: Pedro Ivan Vasconcelos Hollanda
Tema recorrente em consultas de nossos clientes é a incidência ou não do ITBI (Imposto de Transmissão de Bens Imóveis) nas integralizações de bens imóveis em holdings familiares.
O tema aparenta ser simples e ultrapassado, eis que a Constituição Federal dispõe em seu artigo 156, §2º, I, acerca da imunidade desse tributo em tais operações. Assim, aquele que pretende integralizar seu imóvel em sociedade holding poderia assim fazê-lo, sem que houvesse a incidência do ITBI.
Na prática, porém, as dúvidas surgem quando se discute acerca do percentual e do valor que o imóvel será objeto de integralização.
Para isso, deve-se compreender que o ato de integralização é a transformação do bem imóvel da pessoa natural em capital social da sociedade holding, podendo, por exemplo, 1 imóvel representar 100% do capital social da sociedade.
Porém, o bem também poderá ser dividido em parte integralização e parte em reserva de capital da sociedade, por exemplo.
Ou seja, quando da integralização, poderão os sócios decidir se o imóvel será integralizado 100% na sociedade ou se o seu valor será utilizado para integralização e reserva de capital, por exemplo.
Dessa forma, se um imóvel tem o valor de 100 mil Reais, poderá ser utilizado integralmente para a criação ou aumento do capital social da holding, nos mesmos 100 mil Reais, ou ainda para a utilização de parte (R$ 80 mil, p.ex.), como integralização, e a outra (R$ 20 mil) como reserva de capital da sociedade.
Nesse caso, a dúvida reside em saber se sobre os R$ 20 mil incide ou não o ITBI, eis que não foi objeto de integralização, mas sim de reserva de capital.
Diante de reiteradas discussões acerca do tema, o Supremo Tribunal Federal decidiu, por meio do Tema nº 796, de 2020, que: “A imunidade em relação ITBI, prevista no inciso I do § 2º do art. 156 da Constituição Federal, não alcança o valor dos bens que exceder o limite do capital social a ser integralizado.”
Ou seja, definiu o STF que sobre a parte do imóvel que não for destinada à integralização do capital social, incide o ITBI.
Outra discussão que se tem travado nos tribunais diz respeito sobre o valor que deve ser considerado para integralização: se aquele de mercado ou o declarado no Imposto de Renda da pessoa física à Receita Federal, muitas vezes consideravelmente inferior ao valor de mercado.
Assim, fica a dúvida: um imóvel declarado por R$ 100 mil, mas que vale no mercado R$ 1 milhão, deve ser integralizado por qual valor?
A discussão é por demais importante, porque os fiscos municipais, entidades legitimadas à instituição e à cobrança do ITBI, exigem costumeiramente dos contribuintes o pagamento do imposto sobre a diferença entre tais valores.
Mas é de se questionar: é legítima tal conduta das Fazendas Municipais?
Pode-se sustentar que não, eis que o artigo 23 da Lei Federal nº 9.249/1995, prevê, expressamente, que “as pessoas físicas poderão transferir a pessoas jurídicas, a título de integralização de capital, bens e direitos pelo valor constante da respectiva declaração de bens ou pelo valor de mercado.”
Assim, parece não haver óbice ou margem de discussão sobre a impossibilidade da Municipalidade exigir o pagamento de ITBI sobre a diferença entre o valor declarado e aquele objeto de mercado.
Mas a discussão não para por aí.
Há questionamentos, igualmente, sobre a incidência do ITBI mesmo nos casos de integralização em sociedades holding, quando sua atividade preponderante é a compra e venda, locação e arrendamento mercantil de seus imóveis.
Isso porque no artigo 156, §2º, I, da Constituição Federal há a ressalva de que o ITBI não incide na transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital, nem sobre a transmissão de bens ou direitos decorrente de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, “salvo se, nesses casos, a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil”.
É pela parte final do artigo que se discute a incidência do tributo, ou seja, quando a empresa que recebe o imóvel atuar preponderantemente na compra e venda, locação e arrendamento mercantil desses imóveis.
Porém, o que se aventa é que essa exceção à imunidade tributária constitucional se restringe apenas à fusão, incorporação, cisão e extinção da pessoa jurídica, não tratando, especificamente, da incorporação de bens imóveis, que é o tema ora objeto de análise.
Esse foi o entendimento do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, que proferiu decisão, em abril de 2023, conforme se vê abaixo:
INCIDENTE DE ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. ART. 3º, §1º, LEI DISTRITAL Nº 3.830/2006 E ART. 2º, §1º, DECRETO DISTRITAL Nº 27.576/2006. IMUNIDADE TRIBUTÁRIA. ART. 156, §2º, I, CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. INTEGRALIZAÇÃO DE CAPITAL SOCIAL. IMUNIDADE INCONDICIONADA. ARGUIÇÃO PARCIALMENTE ACOLHIDA.
(…)
Assim, sedimentou a interpretação de que a imunidade do ITBI relativa à integralização de capital social é incondicionada e a condição de não exercer atividade preponderantemente para se beneficiar dessa imunidade alcança apenas as hipóteses de transmissão de bens ou direitos decorrente de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica. (…) (Acórdão 1684813, 07051150320218070018, Relator: CESAR LOYOLA, Conselho Especial, data de julgamento: 11/4/2023, publicado no DJE: 28/4/2023)
Como visto, muito ainda se discute sobre a incidência do ITBI em operações de integralização de bens imóveis, eis que, de um lado, está o particular que pretende a criação de sua sociedade holding com a menor incidência tributária possível, e de outro, o fisco municipal sedento por arrecadação.
O tema, portanto, demanda especial atenção dos empreendedores, que necessitarão de consultoria jurídica especializada e atenta às mais recentes discussões sobre o tema.
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