Os impactos da extinção dos terrenos de marinha pela PEC 39/11

Os impactos da extinção dos terrenos de marinha pela PEC 39/11

  • Por:Cunha de Almeida
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Em fevereiro de 2022, a Câmara dos Deputados aprovou a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 39/11, revogando dois dispositivos constitucionais que tratam dos terrenos de marinha, quais sejam, o inciso VII do art. 20 da Constituição Federal e o § 3º do art. 49 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.

Na prática, se aprovada também pelo Senado da República, a medida extinguirá o instituto do terreno de marinha, alterando significativamente a estrutura fundiária brasileira sobre a matéria, na medida em que (i) passa a considerar que as praias são bem comum da população, não podendo ser dominicais da União; e (ii) as áreas excedentes aos limites da praia passam a ser considerados de uso exclusivo, e como tal, devem ser de domínio de determinada pessoa (natural ou jurídica).

De igual maneira, a Proposta afasta a cobrança de foro, taxa de ocupação e laudêmio dessas áreas, contando a partir da data de publicação da Emenda. A União deverá editar, após a publicação, normativa própria que estabeleça os mecanismos de transmissão dessas terras.

Vale lembrar que, atualmente, a partir do aforamento, o cidadão adquire o domínio útil do imóvel e paga pelo direito de utilizar este terreno. O foro é pago anualmente para a União e corresponde 0,6% (zero virgula seis por cento) do valor do terreno.

Além deste valor, paga-se uma taxa de ocupação de terrenos da União, calculada sobre o valor de avaliação do terreno, que varia entre 2% (dois por cento) e 5% (cinco por cento), a depender da data de inscrição do bem junto à Secretaria de Patrimônio da União (SPU), acrescido do laudêmio, que corresponde a 5% (cinco por cento) do valor de avaliação do terreno e das benfeitorias existentes, cobrado nas hipóteses de transação de compra e venda de tais imóveis.

Continuariam em domínio da União apenas as áreas afetadas ao serviço público federal, inclusive as destinadas à utilização por concessionárias e permissionárias de serviços públicos e a unidades ambientais federais, e as áreas não ocupadas.

Passariam aos Estados e Municípios àquelas áreas afetadas ao serviço público estadual e municipal, inclusive as destinadas à utilização por concessionárias e permissionárias de serviços públicos ligadas a tais entes.

Por fim, seriam transferidas ao domínio pleno (i) dos foreiros quites com suas obrigações, as áreas sob seu domínio útil, mediante contrato de aforamento; (ii) dos cessionários as áreas que lhes foram cedidas pela União; e (iii) dos ocupantes as áreas e terrenos sob a sua posse, desde que quites com as suas obrigações, bem como com ocupação ocorrida pelo menos 05 (cinco) anos antes da publicação da Emenda.

 

Imóveis atualmente tratados como terrenos de marinha
Como ficará
Continuariam sobre domínio da UniãoPassariam para Estados e MunicípiosPassariam para domínio pleno dos foreiros e ocupantesPassariam para ocupantes não inscritos na SPUPassariam para cessionários
Áreas afetadas ao serviço público federal, inclusive as destinadas à utilização por concessionárias e permissionárias de serviços públicos e a unidades ambientais federais, e as áreas não ocupadas.Áreas afetadas ao serviço público estadual e municipal, inclusive as destinadas à utilização por concessionárias e permissionárias de serviços públicosÁreas devidamente inscritas e cadastradas no nome do foreiro ou ocupante perante a SPU, até a data de publicação da Emenda Constitucional.Áreas ocupadas a pelo menos 5 (cinco) anos antes da data de publicação da Emenda Constitucional, comprovada a boa-fé da posse.Todas as áreas a eles cedidas pela União.

 

Nas justificativas para o projeto, o Relator na Câmara dos Deputados, Deputado Alceu Moreira, considerou o fato de que “tal situação tem causado uma série de prejuízos aos cidadãos e aos próprios municípios. O principal dano ao cidadão diz respeito a tributação exagerada, tendo em vista que aqueles que possuem ou vivem em imóveis situados em terrenos de marinha pagam o foro, a taxa de ocupação conjuntamente com o Imposto Predial Territorial Urbano – IPTU.”

Nesse ínterim, a PEC estabelece que a União terá de efetuar a transferências das áreas de marinha, de forma gratuita ou onerosa, devendo adotar todas as medidas necessárias para tal no prazo de 02 (dois) anos.

A transferência se daria de forma (i) gratuita, em se tratando de áreas ocupadas por habitação de interesse social; ou (ii) onerosa, nas demais hipóteses. Em se tratando de transmissão onerosa, a União deverá prever, por normativa a ser editada posteriormente, os critérios de cobrança, devendo deduzir os valores pagos a título de foros ou de taxas de ocupação nos últimos 5 (cinco) anos, corrigidos pela SELIC.

As áreas não ocupadas e que sejam de transferência gratuita, requeridas para o fim de expansão do perímetro urbano, serão transferidas aos Municípios, desde que atendidos os requisitos exigidos pela lei que regulamenta o art. 182 da Constituição Federal (Lei nº 10.257 de 2011) e as demais normas gerais sobre planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano.

Atualmente a Proposta tramita no Senado, sob o nº 3/22, aguardando ser pautada no âmbito da Comissão de Constituição e Justiça, e poderá, assim que aprovada pela Comissão e pelo Plenário da Casa, ser devidamente publicada.

Como se sabe, o impacto dessa matéria é tremendo, na medida em que todo cidadão que possui terreno em faixa costeira é enquadrado nas hipóteses abarcadas pelo instituto do terreno de marinha. Sua extinção, por óbvio, afetará a maneira pela qual se exerce o direito sobre a terra, bem como as formas de transmissão da propriedade e custos decorrentes de tais atos.

Portanto, é de grande importância a análise da tramitação da referida legislação, na medida em que, mesmo não sendo aprovada, representa um significativo debate no entorno do instituto dos terrenos de marinha, que há muito tem subsistido no direito brasileiro, a despeito das mais diversas considerações feitas por especialistas sobre a matéria, visando uma atualização das normas sobre o tema.

MATTEUS HENRIQUE DE OLIVEIRA

OAB/PR 109.141

Retirado do Parecer da Comissão Especial da Câmara dos Deputados (https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=888738&filename=PEC%2039/2011)

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